Artigo publicado na gazeta do Povo na terça-feira (27/03). Aqui versao completa.

Durante os últimos dias, o país acompanhou a greve nacional dos professores e funcionários de escola de todo o Brasil o país em defesa da Lei do Piso do Magistério – o Piso Salarial Profissional Nacional (PSPN). Segundo dados da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), a paralisação atingiu o Distrito Federal e 23 estados brasileiros, além de milhares de municípios. No Paraná, os educadores da rede estadual e municipais fizeram uma greve de 24 horas em 15 de março. Na data, houve uma grande caminhada, com mais de 7 mil educadores, pelas ruas da capital. A rede municipal de Curitiba paralisou nos dias 14 e 15.

O curioso foi que a mobilização aconteceu dias após o MEC anunciar o índice de reposição (22,22%) do PSPN para o ano de 2012, elevando-o para R$ 1.451,00 (pouco mais de dois salários mínimos). Valor baixo para quem pensa a educação como política estratégica para o desenvolvimento da nação. Interessante perceber que a reação dos trabalhadores não foi contrária ao MEC, mas sim aos governantes que iniciaram uma cruzada nacional de ataque ao novo valor do Piso e da adequação da jornada dos professores brasileiros.

O questionamento destes governantes coloca em evidência uma das principais contradições do projeto de nação da sociedade brasileira. Por um lado, o fácil e cômodo discurso (consenso na sociedade) de que a educação é indispensável para o desenvolvimento do país. Durantes as campanhas eleitorais este discurso é repetido como um mantra em todos os cantos do Brasil. Por outro, a dificuldade e resistência destes mesmos governantes de garantir condições mínimas para o trabalho dos profissionais de educação. Do discurso à realidade ainda há uma grande distância…

A instituição de um piso mínimo para os professores se constitui em uma tentativa de aliar o discurso mais geral da importância da educação à uma política, ainda que incipiente, de valorização dos nossos mestres que atuam nas escolas. A Lei do PSPN (11.738) foi sancionada em 2008, pelo então presidente Lula, e instituiu um piso salarial mínimo para uma jornada de até 40 horas para os professores da rede pública brasileira. A lei estabeleceu, ainda, a reorganização da jornada de trabalho destes profissionais, a fim de que 1/3 desta seja destinada para o trabalho extraclasse de estudos, preparação de aulas, correção de atividades etc. Este tempo, a hora-atividade, evita que os professores tenham jornada dupla: uma na escola e outra em casa.

Infelizmente, a resistência à aplicação da nova legislação iniciou logo após sua publicação. Cinco governadores ingressaram no Supremo Tribunal Federal solicitando a declaração de inconstitucionalidade da lei. Os argumentos eram de que os estados não teriam condições de adequar à jornada de trabalho, e de que a definição de um Piso Nacional interferiria na autonomia dos entes federativo. Em abril de 2011, o STF negou o pedido dos governadores e declarou a Lei do PSPN constitucional. Mesmo assim, segundo levantamento da CNTE, a maioria dos estados e municípios ainda não aplica a legislação. Levantamento aponta que 17 unidades federativas não pagam o Piso e muito menos aplicam na jornada o 1/3 de hora-atividade. Entre estes, o Paraná.

A justificativa utilizada por estados e municípios para o não pagamento do novo valor do PSPN é de ordem financeira. No entanto, a própria Lei do Piso prevê uma complementação do governo federal, caso o estado ou município comprove não ter capacidade financeira para pagar o valor aos seus professores. No entanto, para acessar esta verba, eles precisam atender alguns critérios, como a existência de plano de carreira e o investimento de, no mínimo, 25% dos impostos na educação.

Paraná – Embora a tentativa do governo estadual de negar o óbvio, hoje, os professores paranaenses recebem, em início de carreira, 18,76% abaixo do Piso. Em relação a hora-atividade, a situação é a mesma. Dos 33% previstos em lei, os docentes têm apenas 20% da jornada implantada em 2003, no início do governo Requião.

Ao anunciar que paga mais que o Piso, o governo do Paraná comete um erro. A legislação nacional estabeleceu um piso mínimo para o professor com habilitação de nível médio. No entanto, o governo estadual utiliza como referência o professor com habilitação de nível superior. Visão equivocada que contraria o PSPN e a própria decisão do STF (que definiu uma vinculação direta do piso com a carreira). Se não fosse assim, o piso se transformaria em teto.

Hoje, o estado paga para o professor com habilitação de ensino médio, em início de carreira, R$ 1.222,00 por 40 horas semanais. Isto corresponde a 18,67% menos do que o PSPN atual de R$1.451,00. No dia da paralisação, o governo se comprometeu em apresentar uma proposta para a APP-Sindicato no próximo dia 27, antes da assembleia estadual dos educadores.

Sabemos que a valorização profissional não é o único fator para a melhoria da qualidade do ensino brasileiro. Mas sem valorização e o reconhecimento verdadeiro da nossa profissão, não se sustenta nenhuma política consistente de fortalecimento da educação. Por isto, em todo o país os educadores reivindicam a implantação da Lei do Piso e a criação de um Piso Nacional para os funcionários de escolas. Estamos, sim, preocupados com condições de salário, de trabalho e saúde. No entanto, nossa luta tem um objetivo maior: queremos uma escola pública de mais qualidade, que garanta autonomia intelectual aos nossos alunos, para que estes nos ajudem a construir, de fato, um mundo melhor.

Luiz Carlos Paixão da Rocha é mestre em Educação pela UFPR, professor da rede estadual do Paraná e diretor Estadual de Imprensa e Divulgação da APP-Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná