Depois de uma semana de reuniões com o governo, reuniões entre a direção da APP-Sindicato, Conselhos e Assembleia Estadual dou uma respirada para tecer algumas reflexões sobre a decisão da nossa Assembleia, de suspensão da greve marcada para o dia 13 de março. Pretendo aqui estabelecer um diálogo com alguns amigos e amigas de caminhada que, ao contrário da decisão da Assembleia, defendiam a deflagração da greve no dia 13. O meu respeito a estes companheiros (a) de travessia me obriga a fazer este diálogo. Não serão divergências momentâneas de avaliação ou de encaminhamentos que nos colocarão em lado opostos nesta nobre trajetória em busca da valorização profissional que merecemos. Dirijo estas reflexões especialmente aos amigos Sebastião, Donizete, Ruy, Viviane, Elaine, Alice, José Natal, Herica, Júlia e outros que, de vez ou outra, estabelecemos bons debates por aqui.

É evidente o forte sentimento no interior da nossa categoria de desconfiança do governo. Esta desconfiança foi criada pelo próprio governo. Em maio do ano passado, após um intenso calendário de mobilização da categoria, e às vésperas de uma Assembleia da APP (que poderia definir o início de greve), o governador apresentou uma proposta: pagamento dos 19,5% referente o Piso Nacional, a partir de maio, negociação do retroativo a janeiro, concurso público para professores, e 33% de hora-atividade. A categoria acatou a proposta. No entanto, o governador cumpriu apenas parte do acordo. Implantou o valor do Piso (desconsiderando o retroativo), e após muita discussão ampliou em 5% a hora-atividade. Isto causou uma revolta em todos nós. Por isto marcamos a greve para o dia 13 de março, para forçar o governo a cumprir o acordo. Até aí há consenso nas avaliações.

A decisão da greve e o calendário de mobilização iniciado na semana pedagógica deste ano forçou o governo a recuar, em pontos importantes da nossa pauta. Recuou em relação a retirada do reconhecimento de titulações no Projeto de Lei de alterações na carreira dos funcionários e , abandonou aquela proposta ridícula de hora-atividade, que tinha como base de cálculo a hora relógio, e não a hora-aula , conforme nossa defesa. Esta foi um importante avanço, visto que na maioria dos estados, de forma organizada avança esta equivocada interpretação da Lei, que tem ganho guarida, inclusive, no próprio judiciário.

Participei de todas as reuniões de negociação com o governo neste ano. Percebi nitidamente o medo do governo de um desgaste político, em virtude de uma possível greve na educação. Por isto, na minha avaliação foram até o limite na proposta. Foram duras reuniões para que o governo se comprometesse em apresentar os projetos de Lei da carreira dos funcionários e da hora-atividade, conforme o texto da Lei Nacional do Piso, e de implantar os 7,115% do Piso em maio, e a antecipação da última parcela de equiparação de 3,47%. Ainda em relação à hora-atividade, abandonando a proposta anterior organizada a partir da hora-relógio, se comprometeu em implantar no início do segundo semestre mais 5% de hora-atividade. O debate dos 3,33% restantes continua. Há todo um debate nacional sobre isto que não está nos ajudando.

Quem tem me acompanhado viu, durante todo este ano, o meu trabalho para a construção da greve. Viajei em vários municípios, conversei com muitas lideranças e fiz todos os esforços para que os materiais produzidos pela APP-Sindicato apontassem para a greve no dia 13 de março. Inclusive recebi algumas críticas por aqui, que imediatamente incorporei-as. Na minha avaliação quanto mais estabelecêssemos um processo de enfrentamento no processo de construção da greve, maior possibilidade de um recuo do governo. Foi o que aconteceu. Se mesmo com este recuo, a maioria da categoria sinalizasse para a greve, eu, e a direção da APP, estaria lá ajudando na sua organização como fiz na greve de 2000 e 2001.

GREVE – A greve é uma das mais poderosas ferramentas de luta do trabalhador. Ela pode ser vitoriosa ou não, rápida ou longa, a depender da conjuntura e a disposição de luta das categorias. Como os mais antigos dizem, entrar em uma greve é fácil, o difícil é encontrar o melhor momento de saída, com o mínimo de desgaste. Uma greve fracassada traz efeitos negativos para uma categoria por muitos anos. Assim, temos sempre o desafio de utilizá-la no momento certo, quando as outras formas de luta já foram esgotadas. Durante o governo Lerner, anos difíceis para a educação, fizemos muitas lutas. Até praças de pedágio ocupamos, mas a primeira greve aconteceu só na metade do segundo mandato. A greve começou com mais de 70% de adesão. E na greve, conquistamos 10% de hora-atividade, dos 20% que reivindicávamos.

Pela sua importância, entendo que a greve deve ser deflagrada em duas situações: quando estamos em um ciclo de retirada de direitos , e/ou quando se esgotam as possibilidades de negociação. Avalio que não estamos em nenhuma destas situações. Aos poucos estamos avançando na concretização dos índices salariais, na ampliação da hora-atividade, e graças as nossas mobilizações, estamos mantendo um canal de negociações com o governo. Evidente, que não na velocidade que gostaríamos. No governo tudo é muito lento e contraditório. Processo este que , da mesma forma que desgasta o governo, desgasta a direção sindical. É o ônus que pagamos por colocar como estratégia de ação a combinação entre mobilização e negociação. Contudo, entendo que nossa categoria hoje tem um bom poder de mobilização e um bom poder de negociação.

Em relação aos reajustes salarias avançamos mais do que em qualquer outro estado, com a aplicação dos reajustes do Piso e com as parcelas da equiparação. Em relação a hora-atividade, conquistamos 10% em 2000, 20% em 2002, 25% em 2012, e 30% em 2013. Vejam que em nenhuma das vezes, a hora-atividade foi implantada no momento da conquista. Os 10% da greve de 2000 foram implantados no início de 2001, os 20% no início de 2003, os 25% no início de 2013.
Falo isto para mostrar como nossa luta não depende só da vontade e disposição de luta . Ela se faz em um emaranhado de contradições. Em nenhuma greve conquistamos integralmente os pontos reivindicados. A política e a vida , não se desenvolvem em linha reta. Atingimos nossos objetivos a partir de uma série de mediações que a realidade objetiva impõe.

Posso estar totalmente equivocado, mas sai com a avaliação de que a greve neste momento, não levaria o governo a ceder mais do que cedeu até aqui. O cenário mais provável seria a de uma greve longa com resultados curtos. Diante do quadro financeiro do estado, que debatemos com o Dieese, dificilmente o governo avançaria na implantação dos 33% de hora-atividade já, ou no pagamento do Piso a partir de janeiro. A queda de receita do estado foi um dos motivos da não implantação dos 33% de hora-atividade. No ano passado, o governo ultrapassou os 30% dos recursos para a educação. Claro que criticamos a forma como o governo utiliza o dinheiro para outros fins, como propaganda, promoção pessoal, e a recém criação de cargos de confiança. Mas a variação receita e despesas pesam muito na hora da negociação. Pelo olhar financeiro o governo apresentou uma proposta limite. Uma greve, dificilmente não iria mudar este quadro.
Confesso que por vezes, fiquei em dúvida se não era melhor a aprovação da greve. Mas dois fatores para mim foram decisivos. O recuo do governo nas últimas negociações e , o desejo da maioria da categoria, com este novo cenário, de não ir para greve. Vontade que ficou expressada na Assembleia. E isto, não é por causa da direção sindical. Havia um apelo grande nas principais regiões do estado, de suspensão da greve.

Em relação ao receio de que o governo não vai cumprir o acordado, é um risco que sempre corremos. Todas as nossas conquistas passaram por mesas de negociação. Vamos ter que manter a pressão no governo para que estas sejam concretizadas.
Entendo a posição de vários companheiros e companheiras que defendiam a manutenção da greve, mesmo com a alteração do quadro de negociação. Uns por acreditar que nossa categoria está sendo enrolada, outros com o objetivo político eleitoral de desgastar o governo, e alguns grupos, com o objetivo de fazer a luta política contra a direção da APP-Sindicato. Tudo isto é legítimo. No entanto, especialmente os dois últimos motivos, não devem ser utilizados como parâmetros centrais para a definição da organização da luta da categoria.

Lembro que a tese da greve permanece. Ela foi só suspensa. A qualquer momento, diante da avaliação da categoria, ela pode ser recolocada. Finalizo conclamamos os companheiros e companheiras a continuarmos juntos nesta luta pela valorização da nossa profissão, e da construção de uma sociedade melhor. Precisamos aproveitar este momento para fortalecer ainda mais o sindicato. Precisamos trazer aqueles e aquelas que ainda não estão sindicalizados à fazer parte desta história de luta da nossa categoria. Bem o mal, o sindicato é o único instrumento de luta que temos para melhorar nossa carreira. As divergências tornam o sindicato mais vivo e plural. Sempre devem ser valorizadas. Porém a assembleia é a instância máxima de decisão. Suas definições devem nortear a atuação coletiva da categoria. Daí a nossa força!
Ah! Ao contrário do que alguns estão dizendo: o governo não teve uma vitória em cima da APP ou da categoria. A categoria fez o governo recuar.
Vamos avançar juntos! Temos muita luta pela frente!