Nota de movimentos sociais e negro sobre africanos que, libertados de navio, aguardam definição quanto a status de refugiados
Nós, integrantes do Movimento Negro do Paraná, dos movimentos sociais, entidades que lutam pelos direitos humanos, militantes das mais variadas forças vivas da sociedade civil deste Estado, vimos apelar a todas as pessoas e autoridades que terão nas mãos o destino dos nove nigerianos que até sexta-feira, dia 30 de setembro, encontravam-se detidos em condições subumanas nos porões do navio Yasa Kaptan Erbil, de origem turca, ancorado na baía de Paranaguá, sejam acolhidos em nossa pátria e seja a eles concedida a prerrogativa de refugiados.
Não é nossa pretensão entrar aqui num debate jurídico sobre a propriedade dos termos necessários para a concessão do asilo ou da condição de refugiados. Queremos, isto sim, estender a eles o mesmo direito que foi estendido a milhares de imigrantes de outras nacionalidades que, ao longo de nossa história recente, desembarcaram neste país, seja fugindo de conflitos políticos, religiosos ou sociais. Lembramos que a história do Brasil está repleta de processos imigratórios que abriram as portas da nação a milhares e milhares de imigrantes, inclusive com substanciais ajudas governamentais como foi o caso do estabelecido no Decreto 3.784 de 19 de janeiro de 1867:
“O governo garantirá aos imigrantes que quiserem se estabelecer nas colônias do Estado (Paraná) a plena propriedade de um lote de terra, com as condições e os preços estabelecidos pelo Decreto 3784…”
Além deste decreto específico, outros documentos demonstram como os imigrantes europeus receberam de nossos governantes, apoio em doação de lotes (um lote a cada família), vinte mil reis aos colonos maiores de dez anos, construção de escolas, capelas, oferta de serviços em obras públicas, ferramentas etc. etc. (vide relatório do presidente da Província do Paraná, Adolfo Lamenha Lins, publicado no jornal 19 de Dezembro de 14 de abril de 1877, cf. Antônio Sérgio Palu Filho e Suzete Moletta. Italianos no Novo Mundo, edição dos autores, Curitiba, 2009).
Vale recordar ainda que os nove nigerianos fogem, além de situações de conflitos religiosos, de situações adversas as mais variadas mas fogem, especialmente, da situação de miséria, fome e desemprego que vivem em seu país neste momento. Foram as mesmas razões que impeliram para nossa pátria, milhares de imigrantes europeus e asiáticos que aqui vivem e aqui reconstroem suas vidas. É o mesmo direito que queremos ver estendidos a nossos irmãos nigerianos, especificamente estes nove rapazes que arriscaram a vida para buscar asilo, apoio e acolhida entre nós, em busca de melhores dias.
E, por último, o povo negro, arrancado que foi do continente africano, aqui foi submetido à mais brutal escravidão. Hoje, parte desse povo, uma ínfima parte, livre e espontaneamente escolhe aqui viver. Não lhes daremos uma oportunidade? Fecharemos nossas portas a esse anseio de vida? A opção agora não pode ser técnica, jurídica, legal, mas política e humanitária, acima de tudo.
Cremos no senso de justiça de todos os que forem definir esta questão, especificamente nos membros do Conare – Conselho Nacional de Refugiados.
Curitiba, 3 de outubro de 2011.
123º ano do Fim da Escravidão no Brasil
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná
Comissão do Mercosul e Assuntos Internacionais da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná
Coordenação de Direitos Humanos da Casa Latino-Americana
Fórum Paranaense de Juventude Negra
Centro de Estudos de Segurança Pública e Direitos Humanos da UFPR
Rede de Mulheres Negras do Paraná
APP-Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná
AfroGlobo – Fórum Cultural
Associação Cultural de Negritude e Ação Popular
Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
Pastoral do Migrante
Conselho Permanente de Direitos Humanos do Estado do Paraná
Instituto de Pesquisa da Afrodescendência
Instituto de Defesa dos Direitos Humanos
Casa Latino-Americana (Casla)
Serviço Paz e Justiça na América Latina (Serpaj)
Movimento Negro de Maringá