Este artigo foi originalmente publicado na edição do dia 9 de abril do jornal “Folha de Londrina”. Leia aqui na íntegra.

Apesar do consenso subjetivo presente na sociedade de que a educação é fundamental para o desenvolvimento do país, a mídia nacional pouco discute a relação valorização dos profissionais de educação / condições de trabalho / qualidade de educação, a não ser nos momentos específicos de greves e mobilizações dos educadores. No entanto, estranhamente o tema ocupou, durante o início deste ano, espaços importantes na pauta da imprensa brasileira. A própria ‘Folha de Londrina’ publicou, nas edições do dia 13 e 14 de fevereiro, dois editoriais: “Professor melhora com o pagamento por mérito” e “Mérito ao bom professor: exemplo a seguir”.Esta onda midiática, aparentemente tem origem nas declarações dadas pela secretária de Educação de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro à revista Veja, na edição de 13 de fevereiro de 2008. Na entrevista titulada “Premiar o mérito”, a secretária, ao justificar ações implementadas na rede estadual de SP, afirma: “A velha política de isonomia salarial contribui para a acomodação dos professores numa zona de mediocridade”. Partindo deste entendimento, a secretária “criou” um sistema de condicionamento da ampliação de salários dos professores e funcionários à melhoria dos índices de aprovação e evasão dos estudantes de cada escola. Sistema, segundo a mesma, utilizado em Nova Iorque (EUA). Uma atitude muito cômoda para a agente pública. A questão é que, mais uma vez, a responsabilidade pela melhoria da qualidade da educação é lançada sobre a figura única do “solitário educador.

Os educadores que, historicamente, apesar de todas as dificuldades para o exercício da profissão, têm dado o sangue e a vida pela causa da educação nas salas de aulas e nas ruas, e estão cansados das soluções “fast food”. Estamos cansados de salvadores da pátria que, de vez por outra, surgem com propostas redentoras para a educação nacional. Para a educação não existem receitas salvadoras. Como na vida, a educação é um processo contínuo e complexo. Sendo assim, beira a certo oportunismo transformar nossos ousados educadores em bodes expiratórios pela falta de investimentos consistentes de governos na área.

O sistema apresentado pela secretária de São Paulo, referendada pela própria Folha de Londrina, não foge da fórmula: “Modelo de São Paulo pode ser adotado no Paraná”. Algo que não é, absolutamente, novo. A abertura de espaço para as idéias da “secretária” na mídia nacional (Veja, Folha de São Paulo etc) não se dá de forma ingênua. Estas idéias compõem uma determinada concepção e projeto de organização da sociedade. Compõem o receituário do neoliberalismo e dos organismos internacionais para a educação do terceiro mundo, que tem como um dos objetivos a redução da intervenção do Estado nas políticas sociais. Não precisamos ir muito longe para perceber isto. No auge do neoliberalismo, no país e no Paraná (anos FHC e Lerner), o número de escolas particulares cresceu de forma assustadora; (do maternal à universidade). Este bem público (a educação) esteve muito próximo de ser regulada pelos interesses do mercado capitalista.

Para atingir esta meta, os neoliberais precisam difundir a idéia de que melhores condições de trabalho e melhores salários não interferem na qualidade da educação ofertada. Difundem também a idéia de que os movimentos organizados dos educadores são meramente corporativos. Estes e as “carreiras meramente burocráticas” seriam um empecilho para a educação. Uma visão míope! Os sindicatos sempre estiveram comprometidos com a qualidade da educação. Basta olhar os materiais e propostas produzidas, os seminários e conferências realizados na perspectiva do fortalecimento e da qualidade da educação pública. A sociedade, como um todo, precisa escutar um pouco mais a voz dos educadores.

Quem sabe, a partir daí, as comunidades e os governantes cerrassem fileiras na defesa da melhoria das condições da oferta da educação e da valorização do professor. Quem sabe, a mídia nacional apoiasse de forma incisiva a necessidade urgente da redução do número de alunos por sala de aula, ou uma campanha nacional de atenção à saúde dos educadores. Quem sabe colocaria em sua pauta cotidiana a necessidade da ampliação de recursos para a educação, visando melhoria e modernização dos prédios escolares, os programas de formação continuada aos educadores, os investimentos em recurso pedagógicos para o trabalho docente e, em especial, a melhoria das condições salariais e de vida dos profissionais de educação. Com certeza estaríamos dando passos importantes para a ampliação da qualidade da educação pública.

É bom ficar claro que nós, educadores, não estamos nos isentando da nossa responsabilidade profissional. Como todos profissionais cometemos erros e acertos. Não somos contra qualquer processo de avaliação do nosso trabalho. Muito pelo contrário. No entanto, queremos uma avaliação séria e, de fato, que tenha em vista a promoção da educação, não a punição dos educadores. Uma avaliação que considerasse outros fatores determinantes da complexidade do sistema educacional, entre eles: o grau de investimento do Estado, as condições de trabalho, número de alunos por turma, a gestão democrática, a formação dos professores, a valorização dos educadores, os conteúdos ensinados, e o contexto social em que a escola está inserida.

Ao contrário do que comentava o editorial da Folha: “Modelo de São Paulo pode ser adotado no Paraná”, finalizo estas breves considerações dizendo que este modelo foi parcialmente implementado no Paraná, durante os anos do governo Lerner. Envolto pelo discurso da modernidade e da excelência, o governo da época fechou nossos cursos profissionalizantes, os cursos de magistério, a oferta do ensino regular fundamental noturno, reduziu a matriz curricular e iniciou um processo de terceirização de professores e funcionários. As promoções na carreira foram suspensas e os professores que desenvolviam algum projeto especial recebiam um vale de R$ 100,00, o chamado ‘Vale-Saber’. Eu pergunto: naquele período a educação do Paraná ficou melhor? Se não fosse a resistência da APP-Sindicato, o neoliberalismo teria destruído a rede pública estadual de ensino do Paraná. Não queremos voltar atrás. O ousado modelo adotado por São Paulo certamente não nos serve.